SOTAQUE DE UM POVO NAS BARRANCAS DO VELHO CHICO
“Ê, Marreca Velha que dá coisa… E não é que encontrei cumpade Pedro de Zé de Mila, daí perguntei ele: Como é qui vai o bar cumpade?”
“Ô, meu irimãozim, tá ruim…”
“E o que foi, meu irimão.”
“Antigamente era um diabo dum DDD. Eles chegavam e gritava: “Pedro, me dá uma celveja”. Quando eu ia distampano, eles perguntavam: “tem DDD”? Eu dizia tem não, meu irimão. Ai eles diziam: “então quero não”
“E o senhor já comprou o DVD?”
“Comprei, fi de Deus. Mas, inventaram agora um tali dum pendaco. Diz que o trem pega mili música. Será qui tem esse tanto de música no mundo, meu cumpade?”
“Tem sim, cumpade. O pendrive do meu fi tem um balceiro de música.”
“Apois! Agora eles num quer beber mais lá, porque meu som num roda o diabo desse pendaco.”
“Tempo bom era aquele que a gente pegava uma radiola e saia farriano por debaixo dos pés de jotobá, na sombreira do cruili e na refrega fresca do juazeiro. O tira gosto era mandim frito com farinha azeda. Vez em quando um violão ou uma sanfona véia de oito baixo. Quem era bom nela era Olavo. Até isso acabou, meu irimão. O hômi agora só quer tocar teclado. Ele deixou de ser o Olavo Arrasta Povão, pra ser Olavo Safadão.”
Coisa de Xique-Xique na Bahia
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DICIONÁRIO BEIRADEIRO
Balceiro – Grande quantidade, muito, bastante.
Cruili – Fruta da margem do rio
Jotobá – Jatobá
Merreca velha – Povoado
Olavo – Maior sanfoneiro da região
- Author Details
Arilson Borges da Costa ,nasceu em 22 de fevereiro de 1970, em Xique-Xique – BA. Filho de sorveteiro e neto de pescador, é professor. Estudou contabilidade na escola pública de Xique-Xique, Bahia, porém em 2008 abandonou a área de exatas e passou a estudar letras vernáculas, na Universidade Estadual da Bahia (UNEB). Ao longo de sua vida acompanhou pescadores às margens do rio São Francisco, no intuito de entender o sotaque do povo ribeirinho, por isso migrou seu trabalho para escrita de contos e causos do povo.