Vô Esperidião

Meu saudoso avô Esperidião Marcolino criava cabra leiteira só para emprestar para as “mães da seca”. Quando a criança nascia, os pais pediam emprestada uma fêmea em fase de aleitamento. Quando parava de beber leite, o animal era devolvido e emprestado para outra mãe.

Esperidião Marcolino. Foto: Zuleide Lessa
Esperidião Marcolino. Foto: Zuleide Lessa

Nessa época, a vida dos pobres não tinha assistência do governo. Meu avô criava em torno de 80 cabras com esse objetivo, na fazenda Retiro de Baixo, a 10 quilômetros do rio São Francisco, no atual município de Palestina, em Alagoas.

Fui passear em Alagoas cinco anos depois que vovô tinha falecido. Eu estava na casa de minha avó Elisa Lessa. De repente, eu e vovó escutamos as cabras berrando. Chegou um casal com cabeças de cabra. Eles disseram que vinham devolver os bichos, prova de caráter e honestidade de um povo pobre, mas não corrompido.

Lembro ainda que eu ia sempre nessa fazenda, nos finais de semana. Descobri que meu avô curava bicheira dos animais – bois, cavalos, jumentos – no rastro. Lembrei dessa história, ao ler a reportagem de Meus Sertões sobre os vaqueiros de Malhada de Pedras, esta semana.

Eu testemunhei a cura de um jumento feita por ele, que cuidava das bicheiras dos animais na região de Palestina, onde parte dos Marcolino e dos Lessa residem. Então, pedi para ele me ensinar a reza. Ele respondeu que só poderia fazer isso perto de morrer, senão perderia a força da oração.

Em 1973, me mudei para o Paraná e perdi o contato com ele. Meu avô morreu de derrame dez anos depois. Hoje, a fazenda pertence aos oito filhos dele. Marcolino Esperidião foi um homem nordestino de coração enorme e sábio.

Sinto muitas saudades.

Zuleide Lessa Contributor
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Uma resposta

  1. Noutros tempos a vida nos sertões do NORDESTE era dura e bastante difícil. Sem assistência dos governantes, o sertanejo tinha que se transformar num verdadeiro herói á prova de secas e cangaceiros e outras intempéries.

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