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Os espaços vazios na Bernardino Bahia, no lado onde os lambe-lambes se concentram há décadas, não pararam de aumentar nos últimos anos. A praça fica no centro de Feira de Santana, um dos pontos mais movimentados da cidade.

Seja por morte do dono ou por desistência ou abandono, a profissão está sendo abandonada. Ao contrário de antes, o negócio já não é considerado rentável o suficiente para prover o sustento destes profissionais e dos seus familiares.

Há cerca de uma década eram 30 barracas. Hoje são apenas 15, mas nem todas são abertas regularmente. Um dos traços culturais urbanos mais conhecidos de Feira de Santana caminha a passos largos para a extinção.

Desde o ano passado as barracas de Manoel Brito e Manoel Damasceno estão fechadas. Ambos morreram e os seus familiares não demonstraram interesse em continuar no negócio. Outro, Carlos Alberto, desistiu da profissão.

MÁQUINAS DIGITAIS

 “Não há uma renovação. Os fotógrafos estão perdendo espaço para a modernidade. Modernidade é outro nome para máquinas digitais, que feriram de morte os lambe-lambes”- afirma Carlos Matias dos Santos Cerqueira, há 20 anos na praça.

Os telefones celulares modernos também contribuíram para que os clientes desaparecessem da praça. Celulares e aplicativos se juntaram para escantear os fotógrafos de rua.

A bem da verdade, lambe-lambe virou apenas uma referência para estes profissionais que ocupam as barracas da praça. Todos os fotógrafos usam equipamentos digitais há tempo. A máquina-caixote perdeu a utilidade.

Há muito que aquelas máquinas engraçadas onde o fotógrafo colocava a cabeça dentro da caixa para enquadrar o cliente e que servia de laboratório, mais o inseparável balde onde as fotos eram lavadas, saíram do cenário da praça.

Primeiro foram feridas de raspão pelos equipamentos analógicos. Depois, digitais – desta vez, gravemente. Os fotógrafos que ainda resistem, dizem que as digitais pavimentaram o caminho que está levando a atividade à extinção.

A clientela está cada vez mais rara. Quem passa na praça é logo abordado se deseja tirar uma fotografia 3×4. A disputa é feita cliente a cliente.

Os fotógrafos cujas barracas ficam mais próximas à entrada localizada próxima ao ponto de ônibus da avenida Senhor dos Passos são criticados pelos colegas que ficam mais distantes da principal e mais movimentada entrada da praça.

Dizem que os colegas, ao abordar, praticam a concorrência desleal.

“Quase ninguém passa ou chega ao fundo da praça”, reclama um fotógrafo, que pediu anonimato. Quer evitar arengas com os colegas.

Há mais de 40 anos na profissão, José Alves disse que o que ganha na praça não dá mais para sustentar a família. Oito fotografias custam R$ 8.

AULAS E ALISTAMENTO

A melhor época do ano para estes profissionais é o período de matrículas escolares, quando as instituições pedem fotografias dos estudantes para colocar nas suas pastas individuais.

O alistamento militar dos jovens também foi um nicho de mercado que beneficiou muito os lambe-lambe. Hoje, nem tanto. Outros setores também foram fechados à categoria.

As fotografias nas carteiras de trabalho, de motorista, passaporte e do cartão que garante aos estudantes o pagamento da meia-passagem quando usam o transporte urbano, dispensam o trabalho dos fotógrafos.

“A situação é dramática. Paramos no tempo”, diz o fotógrafo, que já trabalhou como fotojornalista.

É um dos poucos que ainda tem uma daquelas antigas câmeras, reformada, que apenas a exibe em momentos considerados importantes.

 “Só consegue fazer algum negócio quem tem uma clientela antiga ou parte para o corpo a corpo na frente da praça para receber os clientes e oferecer os serviços”, comenta José Alves.

ALIADO AO INIMIGO

Fotógrafo desde 1973 – iniciou-se na atividade ainda criança, como lavador de fotografias em preto e branco, Evandro da Silva disse que reconheceu a sua impotência ante ao inimigo, a digitalização, e juntou-se a ele.

“Comprei uma pequena impressora” – conta.

Ao contrário dos colegas, que levam até meia hora para entregar as fotos aos clientes, ele as entrega em três minutos. A ferramenta é um importante diferencial, mas reconhece que os clientes estão cada vez mais difíceis.

Diz que as pessoas que tiram documentos no Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC) da rua de Aurora ainda os procuram.

“Mas na unidade localizada próxima da Estação Rodoviária não tem movimento porque lá são tiradas fotos digitais”.

De acordo com Evandro da Silva, quem vai aquela unidade só utiliza o serviço dos lambe-lambe quando a máquina do órgão quebra. Ele não demonstra, mas torce para que o equipamento apresente defeito. E que demore a ser corrigido.

Florestano de nascimento, coração rodelense e alma feirense, admirador de forró, MPB, autores nordestinos e músicas dos anos 80, Batista Cruz Arfer  trocou a administração de empresas pelo jornalismo há 27 anos. O gosto pela reportagem alimenta diariamente a paixão que nutre pela profissão que abraçou, incentivado pelo irmão Anchieta Nery, também jornalista e professor universitário. Descende dos tuxás, tribo ribeirinha do São Francisco, torce pelo Verde e pelo Bahia.

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