Medo da violência em Rafael Jambeiro

Um casal de idosos segue pela estrada de terra que liga a sede do município de Rafael Jambeiro à localidade de São Roque do Piratigi. A mulher pede carona e entra no carro contando sua história. Ela está indo conferir o estado da casa que deixou por causa da ‘ladronice’, que está grande na região”. Seu companheiro permanece calado. E ela continua:

“Estão roubando tudo. Vou ver se minha casa ainda tem telhas. Muitas vezes, os bandidos pegam as pessoas, levam para casa e fazem uma bagaceira”, conta.

Segundos depois, pede para o carro parar, desce com o parceiro e agradece.

Nos três dias que passei em Rafael Jambeiro, a 217 quilômetros de Salvador, o que mais ouvi foram queixas sobre o aumento dos índices de criminalidade na região, por onde passam três estradas federais (BRs 324, 116 e 242) e uma estadual (BA-490).

A facilidade de acesso, a precária estrutura e o reduzido número de policiais facilitam a ação de bandidos e traficantes. Por todo o município, incluindo a zona rural, a colocação de grades é a única forma que as pessoas encontram para tentar se defender.

O surgimento de mansões de empresários jambeirenses estabelecidos em Salvador, a partir dos anos 2000, não está apartado do investimento de sistemas de segurança que incluem câmeras e sistema de eletrificação em altos muros.

UMA VIATURA E TRÊS POLICIAIS

O secretário de governo Airton José Borja Martins explica como é hoje a estrutura de segurança, em Rafael Jambeiro, que tem 1.090 km², segundo o IBGE:

“A Polícia Militar só conta com uma viatura e três policiais. Então, se os policiais vão, por exemplo, atender uma chamada no Rosarinho, a 45 km da sede, ela fica desguarnecida. Pior de tudo: se os PMs apreendem um ladrão em flagrante têm que levar para Santo Estevão, a 52 km, porque aqui não tem delegado. Se a prisão for no final de semana, tem que levar para Feira de Santana, a 98 km”

O número de policiais ideal para garantir a segurança do município, segundo parâmetros da Organização das Nações Unidas, seria de 52. Um para cada 450 habitantes. No entanto, é uma meta muito distante, que gera situações constrangedoras que se confundiriam com piadas.

“Já aconteceu na prática de o bandido voltar primeiro do que os policiais. Quando ele chegou na delegacia, havia um advogado que o soltou, enquanto os PM tiveram que ficar lá, preenchendo relatório”, conta Airton.

O secretário observa que para manter a precária estrutura o governo municipal assina convênio com a Secretaria de Segurança para fornecer imóvel e custear as despesas de limpeza, energia e comunicação, além de bancar as refeições (café, almoço e jantar) dos policiais em serviço.

Com relação à Polícia Civil, a inexistência de delegado titular faz com que um delegado substituto passe pelo município uma vez por semana, às vezes duas, de acordo com Airton José:

“Se uma pessoa quiser prestar uma queixa não consegue. Então os índices de criminalidade do município perante o estado são bem menores do que o real “ – acrescenta o secretário.

Em Rafael Jambeiro também não há escrivão. Um funcionário administrativo faz esta função. E o número de investigadores não passa de três.

“A delegacia fica em prédio da prefeitura. O carcereiro é da prefeitura. A refeição dos presos, quando tem preso, é a prefeitura quem paga. Refeição dos policiais e do delegado substituto quando estão aí, a prefeitura banca. Faz parte do convênio firmado com a SSP. O município pode até não cumprir, mas imagina: ele faz tudo isso e é mal servido, o que acontecerá se não fizer? ”  – questiona Airton.

O gestor municipal também se queixa que a cidade não tem comarca e que o Ministério Público está fechando a promotoria. Airton conta que criadores de caprinos e ovinos deixaram de comprar e vender animais na cidade, temendo assaltos.

MÓDULO DESATIVADO

Já a vereadora Magna Lúcia Gomes de Araújo (DEM), a mais votada no município e cumprindo o quinto mandato, lembra que no passado havia um módulo policial na entrada da cidade, no distrito de Paraguaçu. O posto foi desativado em 2011 pelo comando da PM que alegou falta de efetivo.

Magna conta que na última terça-feira, houve uma reunião com representante da PM no município. De acordo com ela, ficou acertado que o governo pagará horas extras para os policiais lotados na cidade dobrar a carga de serviço. Em contrapartida, a prefeitura disponibilizará mais uma viatura e duas motocicletas para facilitar o acesso à zona rural, onde vive cerca de 70% da população.

“A prefeitura vai ter que direcionar verba de outras ações para melhorar a qualidade da segurança. Mesmo assim, isso não atende à necessidade” – diz.

Magna contou que o major PM que participou da reunião informou terem sido registradas sete ocorrências policiais em Rafael Jambeiro, em 30 dias, o que estaria bem abaixo da realidade.

Jornalista, editor, professor e consultor, 61 anos. Suas reportagens ganharam prêmios de direitos humanos e de jornalismo investigativo.

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