Há duas versões sobre o surgimento da Feira dos Nordestinos, oficialmente chamada de Centro Municipal Luiz Gonzaga de Tradições Nordestinas, que hoje é frequentada por cerca de 300 mil pessoas/mês, segundo seus organizadores. Uma delas diz que a ela surgiu no dia 2 de setembro de 1945, quando o poeta paraibano e ex-combatente Raimundo Luiz do Nascimento, o Raimundo Santa Helena, leu o folheto “Fim da Guerra” para um grupo de soldados e nordestinos que aguardavam condução, em São Cristóvão, no Rio de Janeiro.
A outra explicação está relacionada com a chegada dos caminhões que traziam levas de migrantes e as deixavam no Campo de São Cristóvão. Enquanto não encontravam lugar para morar e trabalhar, os nordestinos acampavam na região. Com o tempo, eles passaram a se reunir no local aos domingos para matar as saudades da terra natal e receber notícias dos parentes.
A primeira pessoa a ver nisto uma oportunidade para ganhar dinheiro foi o paraibano João Batista de Almeida, o João Gordo. Natural de Alagoa Grande, ele encomendava mercadorias e alimentos para os motoristas dos “paus- de-arara”, caminhões que transportavam os retirantes em viagens que duravam até 20 dias. Gordo trabalhava com três conterrâneos: Aluízio do Nascimento, o Índio; Dorgival Severino, o seu Dorge; e Antônio Lourenço da Silva.
A feira cresceu, espalhando-se entorno do Campo de São Cristóvão. Apesar do movimento, ficou na clandestinidade até 1982. Para fugir da fiscalização, seus tabuleiros começavam a ser montados no final das tardes de sábado. No começo, os produtos mais vendidos eram alpargatas, chapéus de couro, facas, fumo de rolo, redes, feijão macassa, favas, rapaduras, farinha, carne de sol e queijos.
Sempre muito movimentada, a feira atraía muita gente. Também provocava transtornos. Grupos de jovens faziam arrastões (roubos e furtos) e o excesso de consumo de bebidas muitas vezes terminava em brigas.
Em 2003, a feira deixou de ser ao ar livre e passou a funcionar no Pavilhão de São Cristóvão, obra projetada pelo arquiteto Sérgio Bernardes. Inaugurado em 1952, inspirado na Dorton Arena americana, o pavilhão foi o principal centro de exposições do Rio até 1977, quando perdeu o lugar para o Riocentro. Lá eram realizados salões de automóveis, feiras industriais e a Expoex (Exposição do Exército), durante o período de ditadura militar.
Antes de se tornar o Centro de Tradições Nordestinas. o antigo centro de convenções abrigou barracões de escolas de samba e foi parcialmente destruído por um incêndio. Hoje, possui segurança, cobra ingresso e tem fácil acesso. O estacionamento custa R$ 15 nos feriados e finais de semana e tem capacidade para 800 veículos.
No início dos anos 2000, a feira era formada por centenas de barracas padronizadas. Com o tempo, sofreu descaracterização. Empresários do setor de restaurantes compraram espaços de pequenos lojistas e construíram imensos estabelecimentos.
Uma das pessoas que se rebelou contra a mudança do projeto foi Raimundo Santa Helena. Ele deixou de frequentar o local, que definia como um shopping e não mais uma feira. A medida, porém, agradou os turistas que podem pagar R$ 90 em um prato com baião de dois, queijo coalho, carne de sol, farofa e molho vinagrete para duas pessoas.
Outra atração da feira são os dois palcos com música ao vivo, onde se apresentaram cantores como Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Elba Ramalho, dentre outros. Além disso, espaços para o reggae e uma praça para apresentação de repentistas, além do Memorial do Nordeste, que reproduz uma casa humilde do sertão e possui maquetes, imagens e artesanato típico da região. A tradição do cordel de Santa Helena e do poeta Azulão agora é mantida pelo mineiro Manoel de Santamaria.
Acompanhe com Meus Sertões um passeio pelo pavilhão.
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Jornalista, editor, professor e consultor, 61 anos. Suas reportagens ganharam prêmios de direitos humanos e de jornalismo investigativo.