O ex-caminhonheiro Antônio Carneiro de Oliveira, o Antônio de Roque, 76 anos, tem muitas histórias para contar. Uma delas é sobre uma paixão antiga: uma bicicleta Opel alemã.
Esta é a segunda matéria envolvendo este morador de Ichu, cidade a 178 km de Salvador, publicada por Meus Sertões. A primeira foi a do apagão no circo durante a apresentação do cantor e compositor Luiz Gonzaga. Em breve, encerraremos a trilogia.
A história da bike alemã começa com o industrial Adam Opel, filho mais velho de um serralheiro, que começou a vida profissional na oficina do pai. No início dos anos 1860, após viagem à França, ele fundou a fábrica que tem o sobrenome dele e começou a produzir máquinas de costura, adaptadas para a produção de chapéus.
Em 1884, Adam, mais uma vez em solo francês, teve contato com as bicicletas e resolveu fabricá-las.
A Opel inovou ao usar no pneus enchidos com ar, projetados pelo inglês Dunlop, no novo produto. A empresa se desenvolveu rapidamente. Anos mais tarde, a viúva e os cinco filhos do industrial fabricariam automóveis. Nos primeiros anos, as máquinas de costura e as bicicletas bancaram a produção de veículos.
NO SERTÃO
Antônio de Roque conta que a bicicleta Opel chegou ao Brasil em data incerta, na década de 1920, período em que se iniciava a povoação da atual Ichu.
Após rastrear a origem da “magrela”, descobriu que um dos primeiros donos a trouxe para Feira de Santana, onde permaneceu por cinco anos.
“Depois, ela foi vendida para um comprador de Conceição do Coité, a 27 km daqui” – diz.
Em 1930, o primo do pai de Antônio quis comprar a bicicleta. A forma como respondeu a pergunta do antigo proprietário permitiu o negócio:
“O senhor é rico?”
“Não, mas me chamo Benedito”
“Então vendo por x”
Benedito levou a bicicleta para a Fazenda Canta Galo, onde morava. Depois de casar , foi para a Fazenda Mata, próxima à casa de Roque Carneiro de Oliveira. A Opel era usada para levar documentos do cartório cível de Ichu a Feira de Santana, onde eles eram assinados pelo juiz. No trajeto de ida e volta, se percorria 134 quilômetros.
O proprietário rodou até 1978, quando o desgaste do eixo central tirou a bicicleta de circulação.
Vinte e cinco anos depois, o neto de Benedito, João Darc disse que botaria a velha bike para funcionar, mas não conseguiu.
Antônio de Roque, que ficou paraplégico em um acidente e passou a consertar todo o tipo de objetos “para manter a mente ocupada”, trocou uma Monark 75 pela Opel e resolveu enfrentar o desafio de recuperar a relíquia.
Para isto, fez peças parecidas com as originais – esticador, corrente, canote da sela -, emendou paralama, colocou guidom de moto, freio contrapedal e encomendou adesivos da Opel dos anos 1930, época em que a bike começou a circular na região.
Enquanto recuperava a bicicleta fez outra descoberta:
“Quando limpei para fazer a ombreira do braço, a tinta original alumiou. Eu disse pronto e repintei. Tirei a cor verde, que tinha sido colocada entre os anos 1940 e 1945, e coloquei a original. Foi aí que surgiu a Dona Preta!” – conta ele.
- Author Details
Jornalista, editor, professor e consultor, 61 anos. Suas reportagens ganharam prêmios de direitos humanos e de jornalismo investigativo.