As chuvas que assolam cidades no interior da Bahia neste verão não é motivo de preocupação para os moradores da pequena Ichu, encravada no semiárido, a 180 quilômetros de Salvador. Lá, a inquietação é com a decisão da prefeitura de mudar a data da Lavagem da Igreja do Sagrado Coração de Jesus.
Inicialmente os festejos marcados por concurso de máscaras, de alegorias, de carros alegóricos, banda de música e desfiles de baianas ocorriam no dia do padroeiro, no dia 5 de fevereiro. Posteriormente, essa espécie de pré-carnaval passou a ser realizada na sexta-feira que antecede o dia santo.
Há seis anos, no entanto, começou a discussão se seria melhor realizar a Lavagem no sábado anterior a comemoração da Igreja Católica, hoje sem qualquer ligação com o festejo que existe há 94 anos.
Em 2021, ano em que José Gonzaga Carneiro, dono de uma fábrica de laticínios na cidade, tomou posse como prefeito, não foi realizado o festejo por causa da pandemia de covid-19. Apesar do surto de gripe H3N2[1] e a confirmação de 45 casos de Ômicron[2], nova variante da covid, no Brasil, a prefeitura tem como praticamente certa a realização da festa este ano.
A polêmica mudança da data, que dividiu a cidade, se espalhou como fogo em capim seco nos últimos dias. Entretanto, só foi confirmada três dias antes do Natal, quando a prefeitura e a secretaria municipal de educação, comandada por William Gonçalves, realizaram uma reunião com representantes de grupos que confeccionam máscaras, fantasias e carros alegóricos.
William, cuja pasta organiza a Lavagem, argumentou que o sábado seria o dia ideal porque valorizaria o comércio, permitiria que turistas e ichuenses que moram fora comparecessem ao evento e aumentaria a circulação de dinheiro na cidade.
O secretário anunciou ainda a flexibilização do regulamento, permitindo a utilização de outras matérias primas para a fabricação das máscaras e alegorias, além de outras mudanças. Por fim, afirmou que daria uma motocicleta nova para o vencedor da categoria carro alegórico.
Os moradores que estão insatisfeitos com a alteração da data temem que aumente a aglomeração e casos de doenças como covid e influenza. Desde o início da pandemia foram registrados 468 casos da doença causada pelo coronavírus e pelo menos quatro óbitos.
Explicam ainda que o município não tem infraestrutura para suportar um grande número de visitantes. Citam que o policiamento é deficiente e consideram alto o risco de ocorrência de tumultos e brigas. Além disso, apontam a falta de infraestrutura da cidade. Por exemplo: só 1,2% dos domicílios tem esgotamento sanitário adequado.
Meus Sertões cobriu a festa em 2019, ano em que houve protesto e boicote por parte dos artesãos que criticavam o critério de escolha dos vencedores por parte da prefeitura. Alegavam que havia apadrinhamento político dos concorrentes.
Para saber mais sobre a Lavagem de Ichu clique aqui
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[1] Até o dia 23 de dezembro a Bahia registrou 395 casos de síndrome gripal e cinco mortes causadas pela doença.
[2] Estudo da Faculdade de Medicina da Universidade de Hong Kong analisou a capacidade de replicação da variante Ômicron e indicou que ela pode ser mais transmissível, porém, causa quadros infecciosos menos severos. Isto não significa que não cause mortes.
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Jornalista, editor, professor e consultor, 61 anos. Suas reportagens ganharam prêmios de direitos humanos e de jornalismo investigativo.