O silêncio absurdo de Thiago

Apesar das promessas de sua assessoria, o secretário de Educação de Salvador não respondeu a questionamentos sobre problemas na operacionalização da lei 10.639

Paulo Oliveira

Foram 18 pedidos de entrevistas para o secretário Thiago Martins Dantas, feitos através da assessoria de comunicação da secretaria de Educação de Salvador, entre os dias 4 de outubro e hoje (13/12/2023). Apesar das promessas da assessoria de imprensa, Thiago, que assumiu a função em janeiro deste ano, preferiu ficar calado em vez de informar quais seus planos para resolver questões relacionadas à aplicação da lei 10.639.

Thiago é o segundo secretário de Educação na gestão do prefeito Bruno Reis (União Brasil). O primeiro foi o ex-prefeito de Mata de São João, Marcelo Oliveira (PSDB), substituído por ter se desgastado com os professores. O sindicato da categoria denunciava a falta de profissionais, principalmente nas áreas de artes e educação física, o fechamento irregular de 44 turmas de Educação para Jovens e Adultos e o não cumprimento do Plano de Cargos e Salários da categoria.

Diante da crise, Bruno nomeou Thiago Dantas, procurador do município e sócio do escritório Martins Dantas Consultoria Jurídica e Advocacia. Ao ser anunciado, Dantas disse que suas prioridades seriam investir no aprimoramento da infraestrutura da rede, focar em gestão e melhorar a relação com os professores [1]. Não há elementos para dizer se ele está cumprindo o prometido.

REGISTROS

Os pedidos de marcação de entrevista foram feitos via WhatsApp. Eles foram registrados nos dias 4 e 9 de outubro; 1, 6, 7, 9, 13, 14, 16, 17, 21, 23 e 28 de novembro; 4 e 7 de dezembro. Em alguns dias, a assessoria orientou que fosse feito o pedido para duas profissionais diferentes.

Como a entrevista presencial nunca era marcada, Meus Sertões enviou um questionário no dia 21 de novembro. Não houve retorno. No dia 28 de novembro, enviamos outro questionário, acrescido de perguntas que surgiram a partir do avanço das apurações.

Foram dadas duas justificativas para a falta de respostas. A primeira, no dia 7 de dezembro, é que foram feitas muitas perguntas. A segunda, repetida ontem, é que o final de ano é um período muito corrido na Secretaria de Educação.

Falta de continuidade do trabalho de professores atrapalha funcionamento de escola quilombola na Ilha de Maré. Foto: Olga Leiria

Veja a seguir, o questionário enviado:

“Conforme combinado, seguem as perguntas para o secretário municipal de Educação Thiago Martins Dantas, relacionadas a série de reportagens sobre os 20 anos da lei 10.639

  1. Qual a avaliação que o senhor faz dos 20 anos da lei 10.639?
  2. Qual o grau de prioridade que a secretaria dá ao cumprimento da lei?
  3. Que ações para que a lei avance o senhor tomou durante a sua gestão?
  4. A contratação de professores sob o regime REDA é apontado por gestores escolares como um empecilho para a formação homogênea de professores e professoras, pois o tempo de contrato, mesmo prorrogável por igual período, faz com que eles deixem as escolas quando adquirem conhecimento suficiente para operacionalizar o que diz a lei. Há uma queixa de que sempre se volta à estaca zero, com a entrada de novos professores por este sistema. Diante disso, perguntamos: A – Como resolver essa questão? B- Existe algum concurso previsto para professor e professora efetivo? C- Em caso positivo, quando será e quantas vagas terá?
  5. Professores se queixam da falta de apoio da secretaria para tocarem projetos e desenvolverem atividades. Dentre as queixas estão: A – Falta de verba para compra de objetos cênicos, por exemplo, o que leva os professores a colocarem verbas próprias no projeto. Há uma forma de restituir o que foi gasto? B- Falta de acompanhamento das atividades previstas pela lei 10.639 e de apoio. O que o senhor tem a dizer sobre isso?
  6. A secretaria ainda sente o impacto da pandemia no desenvolvimento de ações e programas relacionados às questões étnico-raciais? De que forma?
  7. O que está sendo feito para recuperar os danos causados pela pandemia de Covid-19 para os alunos e professores?
  8. Os cursos de formação do Cenfran foram retomados? Por que sim? Por que não?
  9. Como o senhor avalia o papel do Nuper no processo de fazer a lei 10.639 ser executada. Que planos o senhor tem para o Núcleo?
  10. O que fazer para melhorar a qualidade dos profissionais da Smed?
  11. A concentração das atividades relacionadas às questões étnico-raciais no mês de novembro, quando a lei determina que elas ocorram durante todo o ano, é outra queixa frequente. Como fiscalizar e garantir a correta e efetiva aplicação da lei?
  12. Quais seus planos à frente da secretaria nos meses que faltam para o término da atual gestão?
  13. Por que a escola que funciona no bloco Malê Debalê [2], fechada há anos, permanece sem funcionar? Quando ela voltará a funcionar? Qual o modelo que será utilizado – escola regular, fundação, convênio? Por que, mesmo sem funcionar, a secretaria mantém funcionários à disposição da escola? Qual o custo de tudo isso?
  14. Qual o modelo de convênio que será assinado entre o bloco afro Ilê Aiyê e a Smed? O que a Smed oferecerá e qual o custo desse convênio para a secretaria?
  15. Que projetos são prioritários para a educação escolar quilombola?

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Notas de pé de página

[1] ‘Novo secretário pretende tornar Educação de Salvador referência no Brasil’.  Bahia.ba – 16/01/2023

[2] A história da escola municipalizada do bloco afro Malê Debalê será publicada após o recesso de final de Ano de Meus Sertões.

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Legenda da foto principal: Advogado e ex-secretário municipal de Gestão, Dantas assumiu a Educação há 11 meses. Reprodução

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A pauta desta série de reportagens foi selecionada pelo 5º Edital de Jornalismo de Educação, uma iniciativa da Jeduca e Fundação Itaú.

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Leia a série completa

PARTE I

A lei fracassou?  As estratégias dos movimentos negros O protagonismo dos terreiros e dos blocos afro Yabás em movimento As yabás I - Mãe Hildelice dos Santos

PARTE II

A escola do portão verde As yabás II – Ana Célia da Silva A hora da verdade O longo e desgastante trâmite no Congresso

PARTE III

Assuntos sobre negros importam A resistência de Lázaro Formação continuada na Uneb Escola reflete filosofia africana As yabás III – Vanda Machado O projeto pedagógico Yrê Aió

PARTE IV – FINAL

'Nenhum secretário teve a temática racial como prioridade' O silêncio absurdo de Thiago Remando contra a maré Pesquisa mostra a realidade brasileira Olívia e os novos desafios As yabás IV - Jacilene Nascimento

Jornalista, editor, professor e consultor, 61 anos. Suas reportagens ganharam prêmios de direitos humanos e de jornalismo investigativo.

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